sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Jingletown

O amanhecer do resto das nossas vidas? Nunca se sabe.

Um ano de descoberta do vírus que eu trato como se não o possuísse. E dizem que isso é até uma técnica para que ela não se desenvolva. Se for, estou garantido. Se não, iludido.

Encerrávamos o ano de 2009 com o vírus ainda como novidade para o meu corpo, meu organismo, minha cabeça, minha visão curtíssima. Encerramos 2010 com a medicação como novidade para o vírus que era novidade há um ano.

Como fecharemos 2011?

Espero que sem colaterais, sem problemas relacionados a isso. Que em 2011 eu possa, não só pela minha distração usual, não me recordar que eu sou soropositivo. Não por falta de engajamento, não por não me assumir perante meu caráter. Mais por uma questão de saúde no sentido amplo essa palavra pode abarcar.

A todos (ou algum) que passarem por aqui, hoje, alegrias! Saúde!

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Colats = Zero

Sem efeitos colaterais imediatos. Amém.

Muito sono pela tarde. Mas poderia justificar isso com meu horário notivago de recesso de final de ano.

O fato é que os temidos pesadelos, sonhos amalucadamente vividos, ânsias, náuseas, tonturas... nada disso aconteceu. Tonturas no primeiro dia, acompanhado de uma sensação de bem estar quase dopante. Claro que, mesmo que eu nem estivesse esperando uma sensação ruim (e eu acho que estava) eu adorei. (rs)

Tenho lido, escrevido, rido, vivido da mesma forma imbecil que fazia um dia antes de começar a medicação. Sem alterações de humor, sem ideias extraordinarias, sem acessos, sem bloqueios. Às vezes uma noção de que as 24h de um dia passam mais rápido do que eu queria, ou do que eu possa e consiga perceber. E isso no segundo e terceiro dia. Não mais.

Hoje li a matéria da revista Época com a capa sobre o cara que se curou após um transplante de medula. Nada que me animasse, até porque as especulações lá são tão mornas quanto minhas frias projeções.

Que o medicamento continue assim, manso.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Sem olhar para trás

Recebi os remedinhos essa manhã com a ansiedade de uma criança que vai ganhar um brinquedo novo. Fiquei olhando praqueles frascos e pensando em nada. Dai abri. Tava lá, do jeito que o médico falou. As cores, as quantidades, tamanhos. As bulas parecem mapas imensos!

Agora, depois de um dia comum, estou na expectativa. Será que terei as temidas sensações? Sobreriverei incólume à primeira noite? Como estarei amanhã, ante-véspera de natal?

Vou separar as doses, deixar o estômago vazio, engolir uma ave maria e acordar amanhã.

"Coloquei meu futuro dentro de mim: um futuro lindo, branco e sem fim. Cheio de esperança."

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Antabuse Molotov

Essa semana começo. Ainda sem saber bem o que penso, o que sinto a respeito disso.

Não li e nem pretendo buscar relatos na internet sobre efeitos, defeitos e desfeitos da medicação.

Veja só, todas as vezes que o médico mencionava a palavra coquetel, ele baixava bastante a voz. Os pacientes na sala de espera.

Todo modo, recebi a notícia com uma tentativa otimista e fraco bom humor.

E vamos viver.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Casa

Levantei paredes tantas
Tantas vezes
Cedi espaço
Dei lugar
Ali

Enquanto necessário
sustentei o lar
Providenciei
Mantive
Provi

Da casa cheia então
Me enxotaram
E sem retornar
Nem rescusar
Obedeci

As minhas paredes
Meu morar
O viver
Lugar
Perdi

Momo morto reina impávido
O carnaval sazonal
De ano inteiro
Festas lá
Eu aqui

Lane

Algo me faz lembrar do HIV todos os dias. Dai tento levar com bom humor, como se fosse uma brincadeira de "vamos ver como é a vida de um soropositivo". Eu em disfarce.

Vejo, abismado, a percepção que as pessoas quase todas têm do que vem a ser um soropositivo, um aidético. Tanto preconceito. É absurdo. Compreensivelmente absurdo. Elas conhecem gente de todo tipo. Gays, idosos, crianças, pessoas com câncer, paraplégicos... "aidéticos", não. Assim supõem, claro.

Somos os tipos de pessoas que as mães não querem próximos de seus filhos. Que as pessoas se recusariam veementemente a beijar na boca, quiçá um aperto de mão rápido. E muita gente, mas muita mesmo, se pudesse, criaria um incinerador tamanho jumbo, e nos queimaria todos, um a um.

Estive visitando o site do governo, moderninho até, e vi o material da nova campanha contra o preconceito. Não é de dar dó? Digo, não a campanha, que essa é bem intencionada e de uma assepsia calorosa. Mas o efeito, as consequências.

Tá certo, deixo o pessimismo de lado. Faz bem crer que ter AIDS é aceitável. De fato, num aspecto, é desimportante. Nos outros quase todos, é meio desesperador imaginar um sem-fim de portas fechadas.

Dane-se, claro. Mas dá sim saudades dos dias em que não se tinha preocupações com exames trimestrais, taxas (sanguíneas e custos de exames), horários com médico, e etc, etc, etc.

Nota mental: tem sido complicado relaxar e gozar. Sempre preocupado se não vou passar o vírus adiante.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Assim eu li

Em algum lugar, durante a semana, li assim e pesquisei. "It's sad being poisonous".

Vai chegando um tempo em que bate forte uma vontade de dizer de novo "por quê?", mas não na base diária.

Nem tudo são dias cinzas. Tive, recentemente, o "momento da minha vida", culturalmente falando. E com muita diversão. Revi pessoas que não via há um bom tempo e conheci mais umas. (rs) Nada do que poderia ser.

Acho estranho como tenho me isolado (repetitivo). Mas esse isolamento, que deve durar ad æternum, tem um lado positivo. Talvez eu entenda melhor o processo de isolamento dos outros.

Nada é culpa do HIV.

sábado, 2 de outubro de 2010

My humps

Misturando tanto as várias versões de mim. Todos temos. Tantas são...

Sinto-me inseguro. Não em relação ao vírus. Nesse, penso todos os dias. Não mais o dia todo.

Em relação a tanto, menos ao vírus, pareço estar decidindo que quero que meu barco afunde, mesmo sem ninguém.

Vejo e vivo com a vida das pessoas ao meu redor. As cotidianas. Mais próximas, nem por isso mais íntimas.

Parece que, sem querer, sem perceber, fui fechando portas. Uma a uma. Não vou dizer que fiquei isolado num quartinho escuro. É mais como se eu tivesse ficado trancado do lado de fora de casa. Ou "das casas".

Não consigo mais ser quem eu era, e isso me frustra - ou me irrita, não sei. E nem consigo ser como eu quero.

E isso nem tem nada a ver com o vírus. (rs)

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Mar asmo

Uma onda de calor paira sobre o país inteiro. E parece então que os dias passam lentíssimos, as horas correm para trás, e tudo é um longo e exaustivo teste de paciência.

A solução é rir. Rir de graça. De tudo. De si mesmo. Até porque as montanhas não vão se abrir, e mesmo que se abrissem, as nuvens nem iriam chegar.

Sorvetes. Aquelas casquinhas anos 80.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

A cara no trabalho

Trabalhando a todo vapor. Chegando cedo, saindo tarde. O emprego virou o 1° lar. A casa, o colchão, o repouso, e, por vezes, uma refeição.

Eu jurava que ao ter HIV, eu priorizaria o viver, caminharia por uma praia no final da tarde, rascunhando minha futura biografia e desenhando gaivotas e coqueiros enquanto beberia uma água de coco... passando os pés de leve na areia molhada. QUAL O QUÊ...! (rs)

A vida tem sido uma correria, uma insanidade, e a isso chamamos de Terapia Ocupacional de Cada Dia.

De que adianta ler tantos textos que se baseam na letra de Epitáfio dos Titãs? Devia ter feito isso, devia ter feito aquilo outro... e não mudar nada, de fato?

Vambora dar um tchau para o patrão, fazer as malas e começar uma fase inédita? Nos textos parece tão fácil. O que falta? Coragem, Clarice. Coragem.

E mais um combo pipoca + refri enquanto assisto a mais um filme empolgante, olhos arregalados, embasbacado a delirar "uau! eu um dia faço isso".

domingo, 15 de agosto de 2010

Cansado, solitário e sorrindo

Sem (mais) dramas. É que ando sem muita paciência com o assunto. Porque tem sido como ter um irmão siamês que só fala de um mesmo assunto toda vez que você olha pro lado. E também porque minha meta de vida nunca foi enriquecer, viver luxuosamente ou algo parecido. Minha meta era simplificar o tal viver.

De todo modo, a carruagem segue, e os cães ladram. Eu sorrio porque estou vivo, ainda não comecei a tomar osARV's (e quando começar, vai ter que ser bom: garantirão minha vida), estou cercado de muitas pessoas que amo e algumas que me amam. Só que elas nem sabem, então quando eu fico com o cérebro/sentimentos/pensamentos cansados, eu fico meio irritado, sem muita paciência. Devem achar que estou louco, ou que eu mudei.

E, realmente, sou outro.

..:: ouvindo Pixies e Iron Maiden ::.. Pulando bastante pela casa inteira (rs)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Assim

Não que eu ache que eu tenha sido vítima. Não mais acho. Mas eu acho esquisito... acho tudo muito esquisito...

terça-feira, 3 de agosto de 2010

(H)À sinceridade

Ao longo desses meses, conheci algumas pessoas. Digo, "caras". E sempre quando algum deles se anima ou tenta me iludir com algo que demonstre afeição, uma aproximação afetiva-emocional maior, eu travo. Instantaneamente me vem a lembrança de que estou com HIV. Paro e penso "porra, esse cara fantástico me aparece só agora???" rsrsrs

Não precisava mas vou mencionar que, logo em seguida, eu penso em mil táticas pra sumir do mapa. Se a coisa evolui, qualquer hora rola sexo e, mesmo que a gente vá com certeza usar preservativo, se eu passo o vírus pra alguém, o que restou do meu mundo em reconstrução vira pó. ¬¬ affs

Fora a coisa toda do segredo. Caraleo, como isso me consome. Se eu me envolver com algum desses caras, e ele me perguntar se está tudo bem eu vou dizer que sim. Mas no fundo estarei gritando em silêncio que não está tudo tão bem assim, que estou com o vírus mais temido do mundo passeando e se multiplicando pelas minhas veias e fibras. Não conseguiria mentir, acho.

Passei a vida inteira tentando ser o mais sincero, aberto, franco e honesto o possível :) . E não é que agora, para me preservar, o jeito vai ser não me envolver. Não vou conseguir lidar comigo mesmo. Namorar um cara e só no meio da coisa toda, passados dias já, contar a ele (e ele literalmente me matar) é muito pra minha vontade quase nata de ser sincero. ;)

Enquanto escrevo aqui, recebo um sms com frases espertas. Ele quer se aproximar. Meus ossos doem. Você entende?

domingo, 1 de agosto de 2010

Pause

Com muitas ideias e vontade de postar, mas sempre deixando de lado. Tentando levar uma vida e um pensamento "normal". Dai, não seria normal vir e lamentar (ou o oposto disso) sobre coisas que sequer estão acontecendo. Porque desde a descoberta da minha sorologia, nada mudou, nem muda(rá). A vida e tudo dentro ou fora dela segue o mesmo caminho.

Talvez quem ler isso, ou eu mesmo, vá pensar que é uma tática de sobrevivência, de aceitação, um enganar a mim mesmo. Talvez seja. Até porque nem eu mesmo sei o quanto disso é verdade.

As vidas seguem os mesmos caminhos. O mundo. A comida e a bebida que eu degusto têm o mesmo gosto (ou falta de). Comédias bobas me fazem rir (ou ficar irritado). E ficar isolado é uma maneira de estar em contato de novo com um grande número de pessoas.

Volta e meia eu fecho os meus olhos e volto ao tempo em que eu era adolescente. Tinha 14, 15, 16 anos. Não conhecia nenhuma pessoa que tivesse HIV. Achava, inclusive (e na época devia ser) um tanto quanto apocalíptico viver soropositivamente. Não cogitava o vírus de forma alguma, mesmo quando lia alguma reportagem a respeito. E era virgem.

Hoje, não só porque já conhecia algumas pessoas hiv+, mas também devido ao que abarco, é toda uma outra visão. Mas me irrita o pouquinho de piedade que às vezes tenho de mim mesmo, e não tenho para com as outras pessoas que conheço e têm o vírus. Não precisamos de piedade. Apoio e continuidade, sim.

Os remédios são agressivos, e a rotina de uma posologia diária, doença crônica, desgasta bastante. Mas é um viver. E nem sei se devemos aguardar uma cura. Eu digo que não deve haver uma espera, um "aguardar". Sabe-se lá quanto tempo de vida qualquer um tem até que a morte chegue. Independente da sorologia. Ninguém nunca aguarda nada para começar (ou continuar) a viver.

Um grande amigo que é mais inteligente, mais bonito e mais jovem que eu e já está na rotina dos remédios, está vivendo. Eu com toda minha suposta rusticidade e imbecilidade talvez tenha a mesma sorte.

E viva.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Stigmas

Garganta infeccionada, febre... antes eu pensaria que era apenas mais um algo qualquer passageiro, fruto do estresse. Agora, fico alerta. Será? - penso. Ou então fico imaginando que daqui a um tempo, quando um sintoma simples assim aparecer, vou pirar tentando saber se é só uma gripe imbecil ou se é algo que vai me derrubar.

Durante o dia, eu penso um milhão de coisas alegres, positivas (sem trocadilho) pra escrever aqui, mas quando chega o momento de pensar no tal do vírus, eu me perco. Só sei que é incrível o número de vezes que eu paro e penso "puts, eu estou com AIDS!". A sensação de que minha ficha não caiu até agora.

Mas creio que em breve, com um pouco mais de tempo pra mim mesmo, talvez eu consiga, quem sabe, assimilar e apaziguar. Não há tempo a perder. É correr pra ajudar outras e outros tantos.

Que se dane a Copa. Eu quero a cura.

domingo, 30 de maio de 2010

Face 2 Face

Encarar o HIV em mim tem sido um problema. Se interrompo uma atividade rotineira durante o dia e me lembro que tenho o vírus, sinto como se fosse a primeira vez que eu me desse conta de tal fato. Bizarro, não? Negação? Sei lá. O susto que tomo em cada uma das 1.942 vezes que "fico sabendo" que estou com HIV num período de 24h tende a me cansar.

Por falar em fatos estranhos, essa noite tive um sonho no mínimo perturbador. Nele, meu pai, não sei como, descobria que sou soropositivo e com isso a tranquilidade familiar (e a minha suposta paz pessoal) se tornava uma coisa qualquer que beirava o infernal.

Sonhos à parte, recentemente tomei conhecimento de que um antigo rolinho também está com o vírus. Fiquei uns 5 anos sem vê-lo até que, num show de MPB no ano passado, por um acaso, nos encontramos. Eu não o reconhecí. Será que ele mudou tanto por causa dos remédios? Por causa do vírus?

O fato é que, com mais esse, são três pessoas que eu conheço pessoalmente e que estão na mesma condição que eu. Fico, obviamente, imaginando quantas mais das pessoas próximas não estão também assim. Real: somos todos homossexuais que levavam uma vida sexual divertida e interessante, por mais protegida e segura que pretendesse ser. Engrossamos estatísticas.

Há anos não se fala em grupo de risco, mas o tal comportamento de risco parece ser ainda maior no nosso grupo. Por mais que eu ainda esteja em dúvida se a "culpa" da coisa toda foi de uma afta ou de alguma ferida em minha mucosa bucal. E não é que eu me lembro mesmo de aftas? :/

Esperando o resultado de (mais) uns exames. Tudo leva tempo. Dai espero vir aqui e postar sobre temas mais amenos e positivos. Sem trocadilho.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Denver

Ainda devendo um exame. Mas a coleta só é feita num horário estritamente preciso, justo quando eu menos posso. Logo arranjo tempo.

Essa rotina de exames, pedidos de exames, laboratório, atendentes que não têm preparo para agir com naturalidade ao lidar com pacientes com HIV (por mais que o vírus já esteja por ai há mais de 20 anos), tudo isso é exaustivo. Impossível manter um sorriso numa fila, numa sala de espera, num consultório. Mas é pra manter a saúde, a vida. Sobrevive-se.

E sei também que nem posso dar um pio sequer. Não ainda: vai chegar o momento da medicação, e nem faço ideia de como meu corpo, meu organismo vai reagir. Ou seja, por enquanto as coisas estão sim muito boas.

Há ainda um pouco de paranóia. Peguei uma gripe leve esses dias e já fiquei imaginando o quanto dela não era por causa de baixa imunidade ou se havia alguma relação com o HIV. Daí, dias depois, um furúnculo na perna. Mais sinais de baixa imunidade?

Preguiçoso e ansioso pela próxima consulta com o infectologista.

sábado, 1 de maio de 2010

Nova Perspectiva

Vida corrida demais. E segundos exames. Peguei os resultados mas ainda não os levei ao infectologista. Alguns dados diferem levemente dos primeiros exames. Mas não imagino, devido aos números, terminologias e minha preguiça, se essa diferença é normal, boa ou ruim.

Passei uns dias meio pra baixo, imaginando que "vou morrer mesmo, então foda-se" e me encostando nessa desculpa pra simplesmente não me importar com uma série de fatos cotidianos que merecem sim a minha atenção.

Ok, todos vamos morrer um dia, com certeza, e ninguém deixa de cumprir com suas obrigações por conta disso (alguns deixam por motivos mais imbecis ainda ¬¬). Então voltei ao meu quase estado real/inconstante de sempre.

Mais recentemente, conheci um carinha que me parece ser hiper gente boa. PORÉM (comigo sempre parece ter um porém) quando estou com ele, só conversando mesmo porque ainda nem cogitamos trepar, não consigo parar de pensar que tenho HIV, que vou morrer primeiro que ele, que pode ser que eu o contamine e ele, com razão, passe a me odiar, a querer me matar! AFF!

E enquanto isso, enquanto eu fito o horizonte e tenho essa bad trip viral, ele está lá numa boa, falando sobre como foi o dia dele, numa tranquilidade que eu invejo por não ter mais. Ou nunca ter tido. Nem acho que terei.

Claro que meu dispositivo de defesa, que funciona para mim e por ele, já está ativado: inconscientemente comecei a procurar defeitos na coisa toda. Ele joga papel de bala, chiclete mascado, e outros lixinhos na rua. Ele tem preconceitos demais. Ele... ele... sei lá. Não quero encontrar alguém que um dia talvez me peça um exame ou veja meus remédios (que terei de tomar) e me pergunte do que se trata. Não quero dizer "tenho HIV" e ver a pessoa sair correndo depois de cuspir na minha cara e dizer "se eu tiver pego de você, você é um homem morto!"

Os remédios. Li de gente que tomou imediatamente após saber da condição H+. Li de gente que está há dois, três anos sem nunca ter precisado. Temo pelos efeitos colaterais, temo querer dar uma de Renato Manfredinni Júnior e simplesmente não tomar os medicamentos por escolha. Seria suícidio?

Requer pesquisa.

Obs: Tenho estado ausente de situações onde eu obrigatoriamente devia estar atuante. Tentando muito voltar a velha forma e retomar qualquer coisa. Juro que sim.

domingo, 11 de abril de 2010

O sorriso deles

Longo tempo sem escrever.

E então chegou a hora de fazer os exames. Penso no quanto vou gastar de novo. Penso em tudo e quanto isso vai custar pra mim psicologicamente. Mas, mais uma vez, essa é a vida agora.

Os dias tem passado rapidamente. Trabalhando demais e às vezes me espanto ao lembrar que tenho HIV. Penso "caralho, estou com AIDS!" como se eu não soubesse. Muito provavelmente porque ainda não estou na rotina medicamentosa (essa palavra existe?).

Nos últimos 30 dias eu conheci duas pessoas. Com ambos, muito desconforto antes, durante e depois da transa. É andar na corda bamba equilibrando um copo de ácido na cabeça. Por mais que tenha uma rede de segurança logo abaixo. Estou lá trepando com o cara mas pensando "não posso gozar na boca dele, não posso isso, tenho que tomar cuidado com aquilo". Um festival de preocupações que me fazer aproveitar pouco.

Por fim, não tive nada além de sexo e suposta amizade com nenhum dos dois. Sempre pensando que se aquele momento se extendesse por um mês, meses, um ano, eu não teria coragem de fazer de conta que não tenho o vírus. Obviamente não é a mesma coisa que se declarar cardíaco, diabético ou israelense. Imagine como esconder os remédios, quando eu tiver que tomá-los.

Fora a tendência que tenho a achar que esse rojão eu seguro, eles não. Penso que eles não tem estrutura psicológica, emocional, familiar, o que quer que seja. Arrogante eu, né? Como se eu fosse uma fortaleza superior. Ou como se essa situação não me desgastasse nem um pouco. Por mais que eu não admita.

Eu não quero sofrer com o HIV. Não sei se eu já comecei. Ainda tenho dado risada.

domingo, 14 de março de 2010

Front

Nada de novo. Novamente.

Esperando o dia de voltar ao Infectologista e levar os exames que farei em abril.

Páscoa. Vai que alguma coisa acontece, não? rs

No mais, por enquanto, como se eu não tivesse algo.

Monótona Mente

Os dias têm passado arrastadamente. E quando dou por mim, um punhado deles já escoou na ampulheta. Parecem nem ter existido.

Puxo pela memória, que resolveu mancar como forma de compensação, e relembro de tudo forjado a ferro & fogo em brasa. Risos, momentos alegres, a leveza do amor dos que me amam, a dureza e a rispidez das obrigações existenciais. Houve tanto, e nada vi. Ou nem muito desse tanto eu vivi.

O drama menor talvez seja o legado da (in)consequência maior, por mais inocente que eu seja, por mais que eu tenha recebido um algo que eu não encomendei. O desespero, não.

Sem Motivos

Tenho vivido como se eu fosse morrer. E temo morrer como se não tivesse vivido o bastante, ou a parte que me cabia. Descabidamente, triste fim esse seria.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Todo Dia, Toda Hora

E então alguém está muito interessado em mim.

Como não poderia deixar de ser, nem estou tão interessado assim. O que é uma pena, óbvio, porque eu queria muito estar interessado em alguém, mesmo que fosse nessa pessoa, "só" pra poder retribuir o sentimento.

Mas daí vem o crucial momento: e quando formos transar? Vou conseguir me conter? Seria a primeira pessoa desconhecida pra quem eu iria deliberadamente contar.

"Ele vai fugir, vai ficar com medo, e a notícia vai se espalhar", penso logo em seguida. E isso, vale lembrar, sendo que eu sequer estou tendo algo, nem beijamos na boca ainda. Namorico das antigas. Aquela fase de conhecimento.

Se eu passar o vírus pra alguém (e vier a ter conhecimento disso), sei que nunca vou me perdoar. E que a autoflagelação a qual vou me impor, provavelmente vai me enloquecer.

Em suma, antes do HIV eu estava relativamente bem em minha autosuficiência, sem namorar, apenas transando eventualmente com a mesma meia dúzia de parceiros. Saber que carrego o vírus famoso em meu organismo me faz, talvez inconscientemente, carente. Mais do que o recomendável.

Tenho tentado remediar a coisa toda sendo o mais carinhoso, gentil, generoso e agradável o possível com as pessoas que conheço (ou não). Tentar doar algo de mim (que não a merda do "vírus mau") e fazer o bem vai me aquecendo.

No mais, as coisas todas estão a caminhar. O labor, os amigos, as famílias. Meu compromisso com a vida é fazer as pessoas felizes. Nada ainda me impede. Que bom.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Nau Frágil

Sigo em vela, o vento que me esparrama lento os dias
Num mar seco
De areias brancas, finas, quentes e ásperas

A esperar, longas esperas
Perdi meu mapa, meu destino
Confundindo a proa, a prancha e o leme

A madeira do casco e o ranger do cais
Ruindo o mundo abaixo do meu mar
Desfaz o barco de sonhos abaixo de mim

Aos 17, acordado, lúcido, e prepotente
Jamais poderia mesmo em pesadelos
Cogitar que eu teria esse desfecho, sequer esse fim

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

É só por hoje, de novo...

Informações excessivas a estranhos novamente. Pois fui a um centro médico para tomar algumas das vacinas que o infectologista recomendou. O senhorzinho atendente ficou sabendo da minha sorologia, até porque tive que levar um exame meu que comprovasse tal. Conversamos então por uma meia hora sobre tudo: contágio, atitudes, pessoas que por ali passam e seus problemas. Tudo na base da "estimativa" ("por aqui passam 'x' pessoas por dia, 'y' tem HIV e mesmo assim continuam transando sem preservativo").

Tenho que admitir que ir a um centro de saúde público foi complicado. Cheio de pessoas, aquele tratamento cinco estrelas típico de um pronto-socorro gratuito. E o constante pensamento de que meu futuro será passar muito tempo frequentando esse tipo de ambiente, pegando filas, senhas, tendo que esperar muito tempo pra ser atendido, adaptando meus horários de trabalho aos horários que eles atendem.

Ultimamente tenho conseguido acordar e quase não pensar no fator HIV em minha vida. Mas todas as vezes que olho pra alguém e me interesso, basta a pessoa sorrir que eu logo penso "não posso destruir esse sorriso colocando um problemão na vida desse cara". Sinto-me responsável pela minha saúde e pela das pessoas que eu poderia colocar em risco. Não que se alguém contrair o vírus transando comigo esse alguém vá morrer imediatamente, mas só de imaginar eu sendo o "culpado" de fazer alguém passar pelo estresse do exame positivo, uma vida inteira se tratando, possíveis efeitos colaterais... é muita coisa.

Estar semi psicologicamente amparado por um psicólogo, de modo hiper informal, tem ajudado. e amigos, amigos, amigos.

Já quase de volta a parte que me cabe. Que é amparar os outros todos.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Monocórdico

Lendo tanta coisa positiva. Mas mesmo a própria palavra, essa sendo positiva, me lembro de que sou positivo. Sem drama, isso.

Sou um sub-gueto e me aceito. Ou tento cada vez mais me aceitar.

Lamento apenas não ter tido muito tempo para as pessoas que eu amo, para as coisas que me agradam. E às vezes vivo como se eu estivesse ignorando o fato de que tenho o vírus. Daí é como se eu rejeitasse os pensamentos sobre a rotina que terei que viver num futuro.

Por enquanto, daqui por diante, não sei mais identificar em mim se eu era quem eu sou.

Tabalho sorrindo.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Copo

Copo meio cheio ou copo meio vazio?

Meio cheio de quê? Até que parte? Copo meio cheio, estômago meio vazio, cabeça muito cheia.

Quebre o copo, esvazie a cabeça, arranje um meio.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Infecto

Fui ao médico infectologista levar meus primeiros exames mais específicos. Saí de lá com esperança renovada. Andava meio combalido e negativista. A consulta me fez muito bem. Atendimento profissional feito por quem ama a profissão (e o ser humano) faz toda a diferença.

Tenho passado muito tempo com pessoas muito inteligentes, divertidas e extremamente doces e carinhosas. Mais saudável e salutar que isso, impossível.

Nas palavras dO Poeta: "E nossa história não estará pelo avesso assim sem final feliz. Teremos coisas bonitas pra contar. E até lá, vamos viver. Temos por fazer. Não olhe pra trás. Apenas começamos. O mundo começa agora. Apenas começamos"

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Titã

Uma semana de 2010. Não parece. Já não sei quem sou.

Politicamente, os EUA liberaram o veto aos portadores de HIV que queiram entrar no país. Somos mesmo os "bois-de-piranha" nessa coisa de AIDS, não é mesmo? Se pararmos pra pensar, a coisa inteira é muito recente. Vai ver por isso esse tipo de absurdo se manteve por tanto tempo, relativamente.

A escravidão no Brasil foi abolida há pouco mais de 100 anos, pouquíssimo tempo, dentro da história toda da humanidade. AIDS, estudada e relatada, não tem nem 30.

Quando vem a cura? Precisamos logo, por favor.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Novo Ano

Às vezes esqueço por completo. Às vezes é só no que consigo pensar. Às vezes tenho crises e penso que a coisa toda vai me matar em breve. Às vezes tenho um momento longo, que eu não sei dizer se é de lucidez ou delírio, e lembro de estatísticas e gente medicamente esclarecida me dizendo que AIDS não mata mais nos tempos em que vivemos.

2010 chegou e eu nem vi. Parece a extensão do ano que não terminou. Em breve começa, e que comece muito bem.