sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Jingletown

O amanhecer do resto das nossas vidas? Nunca se sabe.

Um ano de descoberta do vírus que eu trato como se não o possuísse. E dizem que isso é até uma técnica para que ela não se desenvolva. Se for, estou garantido. Se não, iludido.

Encerrávamos o ano de 2009 com o vírus ainda como novidade para o meu corpo, meu organismo, minha cabeça, minha visão curtíssima. Encerramos 2010 com a medicação como novidade para o vírus que era novidade há um ano.

Como fecharemos 2011?

Espero que sem colaterais, sem problemas relacionados a isso. Que em 2011 eu possa, não só pela minha distração usual, não me recordar que eu sou soropositivo. Não por falta de engajamento, não por não me assumir perante meu caráter. Mais por uma questão de saúde no sentido amplo essa palavra pode abarcar.

A todos (ou algum) que passarem por aqui, hoje, alegrias! Saúde!

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Colats = Zero

Sem efeitos colaterais imediatos. Amém.

Muito sono pela tarde. Mas poderia justificar isso com meu horário notivago de recesso de final de ano.

O fato é que os temidos pesadelos, sonhos amalucadamente vividos, ânsias, náuseas, tonturas... nada disso aconteceu. Tonturas no primeiro dia, acompanhado de uma sensação de bem estar quase dopante. Claro que, mesmo que eu nem estivesse esperando uma sensação ruim (e eu acho que estava) eu adorei. (rs)

Tenho lido, escrevido, rido, vivido da mesma forma imbecil que fazia um dia antes de começar a medicação. Sem alterações de humor, sem ideias extraordinarias, sem acessos, sem bloqueios. Às vezes uma noção de que as 24h de um dia passam mais rápido do que eu queria, ou do que eu possa e consiga perceber. E isso no segundo e terceiro dia. Não mais.

Hoje li a matéria da revista Época com a capa sobre o cara que se curou após um transplante de medula. Nada que me animasse, até porque as especulações lá são tão mornas quanto minhas frias projeções.

Que o medicamento continue assim, manso.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Sem olhar para trás

Recebi os remedinhos essa manhã com a ansiedade de uma criança que vai ganhar um brinquedo novo. Fiquei olhando praqueles frascos e pensando em nada. Dai abri. Tava lá, do jeito que o médico falou. As cores, as quantidades, tamanhos. As bulas parecem mapas imensos!

Agora, depois de um dia comum, estou na expectativa. Será que terei as temidas sensações? Sobreriverei incólume à primeira noite? Como estarei amanhã, ante-véspera de natal?

Vou separar as doses, deixar o estômago vazio, engolir uma ave maria e acordar amanhã.

"Coloquei meu futuro dentro de mim: um futuro lindo, branco e sem fim. Cheio de esperança."

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Antabuse Molotov

Essa semana começo. Ainda sem saber bem o que penso, o que sinto a respeito disso.

Não li e nem pretendo buscar relatos na internet sobre efeitos, defeitos e desfeitos da medicação.

Veja só, todas as vezes que o médico mencionava a palavra coquetel, ele baixava bastante a voz. Os pacientes na sala de espera.

Todo modo, recebi a notícia com uma tentativa otimista e fraco bom humor.

E vamos viver.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Casa

Levantei paredes tantas
Tantas vezes
Cedi espaço
Dei lugar
Ali

Enquanto necessário
sustentei o lar
Providenciei
Mantive
Provi

Da casa cheia então
Me enxotaram
E sem retornar
Nem rescusar
Obedeci

As minhas paredes
Meu morar
O viver
Lugar
Perdi

Momo morto reina impávido
O carnaval sazonal
De ano inteiro
Festas lá
Eu aqui

Lane

Algo me faz lembrar do HIV todos os dias. Dai tento levar com bom humor, como se fosse uma brincadeira de "vamos ver como é a vida de um soropositivo". Eu em disfarce.

Vejo, abismado, a percepção que as pessoas quase todas têm do que vem a ser um soropositivo, um aidético. Tanto preconceito. É absurdo. Compreensivelmente absurdo. Elas conhecem gente de todo tipo. Gays, idosos, crianças, pessoas com câncer, paraplégicos... "aidéticos", não. Assim supõem, claro.

Somos os tipos de pessoas que as mães não querem próximos de seus filhos. Que as pessoas se recusariam veementemente a beijar na boca, quiçá um aperto de mão rápido. E muita gente, mas muita mesmo, se pudesse, criaria um incinerador tamanho jumbo, e nos queimaria todos, um a um.

Estive visitando o site do governo, moderninho até, e vi o material da nova campanha contra o preconceito. Não é de dar dó? Digo, não a campanha, que essa é bem intencionada e de uma assepsia calorosa. Mas o efeito, as consequências.

Tá certo, deixo o pessimismo de lado. Faz bem crer que ter AIDS é aceitável. De fato, num aspecto, é desimportante. Nos outros quase todos, é meio desesperador imaginar um sem-fim de portas fechadas.

Dane-se, claro. Mas dá sim saudades dos dias em que não se tinha preocupações com exames trimestrais, taxas (sanguíneas e custos de exames), horários com médico, e etc, etc, etc.

Nota mental: tem sido complicado relaxar e gozar. Sempre preocupado se não vou passar o vírus adiante.