domingo, 10 de junho de 2012

Padre (ou " Um Dia , Dois Pais ")

Hoje recebi a visita do meu pai. É incrível como o vejo como um ídolo, mesmo tendo os anos se passado e a maturidade me trazido a lucidez pra perceber que ele é falível, de carne e osso, humano.

Enquanto conversávamos durante o jogo do Vasco, transmitido pela TV, o seu telefone tocou. Era sua atual esposa. Me retirei da sala e fui para a cozinha, mas podia ouvir o que ele falava. A conversa durou uns 10 minutos e durante várias vezes ele me usava como exemplo de honestidade, retidão, caráter, e sei lá mais o quê. Eu gelei.

Será mesmo? Digo, será que ele me vê da forma que "me narrou"? E essa visão seria alterada caso ele soubesse que eu sou soropositivo? No nosso mundo perfeito, divórcio é comum, drogas de todos os naipes são utilizadas pelos filhos dos nossos conhecidos, violência urbana aflige uma boa parcela de pessoas do nosso convívio... mas... AIDS? HIV? Não existe.

Às vezes dá vontade de gritar para o mundo inteiro "pronto, tá ok! Sou soropositivo! Aidético! Vamos lutar por essa causa!" - mas daí, logo eu volto a por os pés no chão. Vide a reação das pessoas quanto à parada gay de São Paulo - SP que aconteceu hoje. Li várias críticas negativas nos principais jornais do país. Parece que as pessoas estão realmente criando muros, divisas. De um lado, os gays, do outro, o resto do mundo. Um gay soropositivo deve representar para "o resto do mundo" toda a podridão da vida gay.

Pelo que parece, não muito diferente da época do falecimento de Cazuza e Renato Russo, as pessoas ainda veem o HIV como um castigo. Não temos a piedade e compreensão que um doente de câncer possui. Mesmo que esse câncer seja oriundo de um péssimo hábito (como o câncer de pulmão em um fumante crônico). Não é uma merda? Falto escutar um "bem feito! Quem mandou? Vai mais!", seguido de um "morra, veado!".

Meu pai provavelmente passaria por situações pesadas se eu me escancarasse para a sociedade. Imagino a reação das pessoas que o conhecem. Muitas o tratariam mal. Ele, certeza, não gostaria de saber disso. Mas me apoiaria, sim. A base da nossa relação é amor e respeito. Por mais que isso seja uma decepção ou algo nesse sentido.

Oh, pai... estamos em 2012. Longe, distantes, parece, de uma cura. A cura para a ignorância. Outra feita, os remédios têm me mantido muito bem.

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Atualizando (18/06):

Os exames estão ok: carga viral indetectável, CD4 estável e bonitinho. Só o exame de Vitamina D que está um pouco abaixo do esperado. Já tomando as vitaminas que vão me deixar 100%.